Angela Davis - Estarão as Prisões Obsoletas?
- Virando A Página
- 7 de ago. de 2020
- 2 min de leitura

Na maior parte do mundo, é tido como evidente que uma pessoa condenada por um crime seja mandada para a prisão, instituição encarada como um aspecto inevitável e permanente de nossa vida social. Aqueles que defendem o fim das prisões são rejeitados como idealistas utópicos cujas ideias são, na melhor das hipóteses, pouco realistas e impraticáveis e, na pior delas, ilusórias e tolas. Isso exemplifica como é difícil imaginar uma ordem social que não dependa da ameaça de enclausurar pessoas em lugares terríveis destinados a isolá-las de sua família e de sua comunidade. A prisão é considerada tão “natural” que é extremamente difícil imaginar a vida sem ela.
Discutir se a prisão se tornou uma instituição obsoleta passou a ser algo especialmente urgente diante do fato de que mais de 2 milhões de pessoas (de um total de 9 milhões) atualmente vivem em prisões, cadeias, reformatórios e centros de detenção de imigrantes nos Estados Unidos. Estamos dispostos a relegar um número cada vez maior de pessoas de comunidades radicalmente oprimidas a uma existência isolada, marcada por regimes autoritários, violência, doenças e tecnologias de reclusão que produzem severa instabilidade mental? Ao pensar na possível obsolescência do sistema prisional, devemos nos perguntar como tantas pessoas foram parar na prisão sem que houvesse maiores debates sobre a eficácia do encarceramento.
A prisão funciona ideologicamente como um local abstrato no qual os indesejáveis são depositados, livrando-nos da responsabilidade de pensar sobre as verdadeiras questões que afligem essas comunidades das quais os prisioneiros são oriundos em números tão desproporcionais. Esse é o trabalho ideológico que a prisão realiza – ela nos livra da responsabilidade de nos envolver seriamente com os problemas da nossa sociedade, especialmente com aqueles produzidos pelo racismo e, cada vez mais, pelo capitalismo global.
A questão mais imediata hoje é como prevenir um aumento ainda maior das populações carcerárias e como levar tantos detentos do sexo masculino e do sexo feminino de volta para o que chamam de “o mundo livre”. Alternativas eficazes envolvem a transformação tanto das técnicas de abordagem do “crime” quanto das condições sociais e econômicas que levam tantos jovens de comunidades pobres, especialmente das comunidades de pessoas de cor, ao sistema correcional juvenil e depois, a prisão. O desafio mais difícil e urgente é explorar de maneira criativa novos terrenos para a justiça nos quais a prisão não seja mais nossa principal âncora.
Comments